• 03 MAR 16
    Uso de lança-perfume põe em risco a vida de jovens pelo Brasil

    Uso de lança-perfume põe em risco a vida de jovens pelo Brasil

    Droga pode fazer mal e até matar. Amostras compradas em São Paulo foram testadas e diversas substâncias tóxicas foram encontradas.

    Uma droga antiga voltou reformulada com sabor doce e ainda mais perigosa. A equipe do programa Fantástico, da Rede Globo, passou 4 meses investigando o novo lança-perfume que invadiu a periferia de São Paulo e descobriu por que essa droga pode ser mortal.

    “Rola muito. Rola livre nos bailes”, diz o funkeiro MC Garden. “Você fica olhando para os lados, tudo lento, o coração acelera”, conta o estudante Igor Rodrigues. “É uma droga muito perigosa e muito subestimada”, afirma o psiquiatra Thiago Marques Fidalgo.

    O velho lança-perfume ressurgiu na periferia de São Paulo com uma nova fórmula: “Sabores de coco, cereja, chiclete. Muitos sabores, vários”, diz Igor Rodrigues.

    Na noite de São Paulo, o lança está nas ruas. Só que quem ‘curte’ também está pondo a saúde em risco.

    Para mostrar quanto o lança-perfume pode fazer mal – e até matar – três amostras, compradas nas ruas de São Paulo, foram testadas em um instituto de pesquisas.
    Os resultados foram assustadores: nas fórmulas, duas substâncias de uso industrial. Em menor quantidade, um solvente chamado tricloroetileno – usado, entre outras coisas, para remover adesivos e tintas. Em maior concentração, o diclorometano – uma substância tão tóxica, que é uma das componentes do removedor de respingos de solda. Os dois compostos são quimicamente parecidos com o cloreto de etila, que era o princípio ativo dos lança-perfumes antigos, e é proibido no Brasil.

    Das substâncias encontradas no novo lança, o tricloroetileno tem venda liberada. O diclorometano é controlado, mas o anti-respingo de solda, onde ele é encontrado, é vendido livremente. Por não serem substâncias proibidas, quem vende acha que está escapando da lei.

    “Não é a mesma coisa que portar cocaína, portar maconha, portar êxtase. Mas que são substâncias que sabidamente fazem mal à saúde e que por isso podem ser classificadas como algum crime contra a saúde pública”, afirma José Luiz da Costa, perito criminal e toxicologista.

    “Uma quantidade muito pequena desses novos produtos, você tem um efeito que você precisava de uma quantidade enorme do lança-perfume de antigamente para ter”, conta o psiquiatra Thiago Marques.

    Na gíria, o lança é ‘baforado’, ou seja, aspirado pela boca e vai direto para os pulmões. De lá, entra rapidamente na corrente sanguínea e em segundos, chega ao cérebro.
    “A gente tem duas fases do efeito. O efeito inicial, de euforia, de excitação, de aumento da atividade cerebral. E uma fase de depressão, que você vai diminuir a atividade cerebral. Você tem diminuição da frequência cardíaca, da frequência respiratória, dificuldade de coordenação dos movimentos, da fala”, explica o psiquiatra.

    Evandro Farias, de 21 anos, quase morreu. “Eu comecei a passar muito mal. Dores no peito, sentindo o corpo trêmulo e sentindo formigamento, tontura. Fiz exame do coração, o eletrocardiograma deu tudo alterado. Eu achei que era legal no começo, tipo a brisa era da hora, mas eu fui ver que não era nada disso”, conta o estudante Evandro.

    O filho de 19 anos da Dona Francisca e a filha de 16 de Dona Maria de Lourdes não tiveram a mesma sorte.
    “Ele estava desacordado. O coração dele tava batendo, bem lento. Logo depois a médica veio falar comigo. Ela reanimou ele, mas na quinta parada cardíaca, ele não voltou mais”, relembra Francisca Moraes de Melo, mãe de vítima.

    “Ela estava na emergência, estavam tentando reanimar ela de novo. Ficou entubada e morreu sem falar nada, sem dizer nada, sem reação nenhuma”, lamenta Maria de Lourdes Conceição da Costa, mãe de vítima.

    Para tentar conter o novo lança, uma associação de jovens da periferia de São Paulo organizou uma campanha.
    “Estamos trabalhando em redes sociais, nos rolêzinhos, levando para as comunidades”, diz Darlan Mendes, da Associação “Rolezinho, a Voz do Brasil”. E ajudou a montar um projeto de lei para tentar conter o acesso aos componentes do novo lança – o texto está na Câmara dos Vereadores de São Paulo.

    “A gente fala muito mais sobre crack, a cocaína, maconha e o lança tem consequências muito mais nefastas no longo prazo”, explica o psiquiatra Thiago Marques Fidalgo.

    Fonte: G1